esta fotografia é de uma criança pobre nas ruas de barcelona. tocou-me pela tal "capacidade de reparação" própria das crianças. de continuar e aproveitar a próxima brincadeira. uma das coisas que mais espantou os aliados quando entraram nos campos de concentração nazi, no fim da 2ª Guerra Mundial, foi a quantidade de brinquedos que descobriram. por entre os casebres que cheiravam mal, ou nas ruas que conduziam a enormes fogos a gás, havia pequenos brinquedos feitos com o que havia à mão a testemunhar a vivência de uma infância de alguma maneira protegida pela capacidade de fantasia e imaginação. por outro lado, é frequente em crianças abandonadas, maltratadas, abusadas fisica e psicologicamente, crianças privadas dos seus direitos, fazerem desenhos em que há guerras, morrem pessoas, há muito sangue, mas no final aparece uma ambulância ou um herói, vão para um hospital e "vivem felizes para sempre". "um herói é uma pessoa que salva alguém e depois essa pessoa diz obrigado".
contacto muito com crianças. com pessoas, porque são as pessoas que dão sentido ao mundo, e nessas pessoas há muitas pessoas pequeninas. crianças. há muita dúvida, incerteza, muita subjectividade em tentar chegar ao outro lado de alguém, ao lado de dentro, sem magoar, e resgatar talvez o abuso, talvez as privações, talvez a falta de colo, de uns miminhos antes de deitar, de uma prenda oferecida, de uma brincadeira. na maioria dos casos, o caminho faz-se no que somos e podemos ser uns para os outros, no melhor de nós, tentando criar lugares que possam ser abrigos, onde o mundo possa doer. lugares em que, no maior dos cenários em ruínas, haja uma porta aberta onde se passa e entra. um sítio mais quente.
nesta humanidade capaz de tudo, do prémios nobel, das maiores guerras, holocaustos, crimes, da maior solidariedade e mesquinhez, do maior abraço ao abandono, da felicidade è indiferença ou da ignorância ao conhecimento, nesta humanidade onde todos vivemos, o espaço onde podemos ser mais e melhor nasce exactamente no que somos uns para os outros. em não resignar ao abandono, em estar atento, disponível, deixar que tudo aconteça. porque tudo acontece de facto. "a humanidade vai, tarde ou cedo, aos braços da ternura." essa é a nossa maior fragilidadee a maior força. a que nos diz "sou pessoa".
(graaf)
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