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Fernando

uma vez a Maggie fez anos e fomos a casa dela para a festa. era uma casa muito bonita, ali para os lados da infante santo, com o rio inteiro nas janelas e um céu escuro ao início da noite. a maggie tinha uma saia e um top encarnados, estava com o sorriso de quem faz anos (sei que ela gosta de aniversários), a casa tinha quartos para todos os filhos, cinco. a margarida, a filipa, a teresa, o jonas e o gonçalo (se bem que o gonçalo nessa altura, a existir, só na bariga da mãe).
havia uma mesa grande e comida, muitos livros nas estantes, quartos giros e a vista. havia varandas daquelas pequenas, que se nos pomos lá parece que vamos em descolagem por ai. ou talvez seja como diz o palma, "abriu a janela e voou". eram varandas de voar, sei-o agora.
ficámos noite dentro e madrugada fora. conversámos, brincámos com a aparelhagem que tinha um sistema qualquer em que se passava a mão por um sensor, sem tocar em nada, e a porta do leitor de cd abria-se. passámos a noite a trocar de disco só por isso. a sofiasinha queria pôr um dvd de um bailarino, a leonor e o action conversavam na varanda, os sofás estavam todos ocupados, as almofadas no chão e os pratos sujos acumulavam-se no balcão da cozinha. o mousse foi desaparecendo.
no início da manhã tocaram à porta e entrou o Pai da maggie com o jonas a dormir no colo. disse-nos "olá" baixinho, deitou-o na cama e tinha, de facto, ar de quem tinha estado num casamento de amigos e precisava de ir dormir. disse-nos boa noite e dai em diante as nossas conversas na sala foram mais baixinhas, rente ao chão. fui espreitar o jonas a dormir por já ter ouvido falar muito dele, o pai da maggie não fui espreitar por razões óbvias. sei que olhei pela janela, o dia tinha nascido em lisboa. o céu carregado e baixo de nuvens tinha dado lugar à manhã mais límpida que via desde há muito muito tempo. foi uma manhã que me encheu de esperança, de riso tonto da noitada entre amigos com um teste de anatomia no dia seguinte na inocência dos cigarros fumados quase às escondidas, das conversas multiplicadas em infinito, do chão de madeira, das lombadas dos livros. continuámos a falar sobre uma coisa qualquer de biologia, se havia raças ou não, não sei. voltei a pé para casa com o action, a maggie foi-se deitar depois de sairmos, mas julgo que ainda foi à janela ver o dia nascer antes de se enfiar nos lençois.

o Pai da Maggie voou. tal como essa noite voou, se bem que as manhãs, límpidas ou não, se sucedam todos os dias. e eu sei que ela, que eu amo tanto, se levanta todos os dias apesar de ter mais perto a noite e longe os dias de verão, apesar de ter que tratar de coisas que são só uma cirscunstância e não são importantes, e mesmo assim a vão marcar. continuam todas as noites e dias em aberto onde nos podemos encontrar, com o mousse por servir, os pratos por sujar e um cd novo para ouvir. continuam todos os abraços que ainda vão chegar, os dias de Verão, as chávenas onde(ensinaste-me tu) "quando mexo um café parece que mexo a minha vida inteira". as manhãs, o olhar, o Pai da Maggie continuam como esse dia, se bem que agora é ela que o traz no colo e o deitou. e eu continuo sem o ir lá espreitar por razões óbvias, mas faço questão de lhe deixar um bilhete na cozinha ou na parte de dentro da porta. "guardo o seu sorriso e desculpe termos falado alto. fiquei sem perceber se existem raças ou não, mas as manhãs sim e eu vou entrar nela"

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